Há mais de 4 décadas, nosso calendário marca o dia 8 de março como uma oportunidade para destacar a luta feminina por igualdade de gênero. A data é um estímulo à sociedade para que não esqueça que, por séculos, as mulheres foram institucionalmente excluídas de cursos universitários, competições esportivas, partidos políticos e de tantos outros espaços públicos.
Muito já foi escrito sobre o tema. Contemporaneamente, em seu aclamado livro Sapiens – Uma breve história da humanidade, Yuval Noah Harari relata que a manutenção das mulheres numa posição de inferioridade foi, por muitos anos, justificada sob a alegação de que os músculos, a agressividade e até mesmo a genética seriam os motivos pelos quais as mulheres estariam relegadas a um papel secundário. Contudo, o escritor pontua que essas justificativas não conseguiram se sustentar e foram se deteriorando com o passar do tempo. Percebeu-se que as mulheres são detentoras, em média, de características vitais para a sociedade, como a maior resistência à fome, às doenças e à fadiga. Além disso, costumam ter melhor capacidade de se comunicar e colaborar.
De fato, a história recente nos brinda com dezenas de mulheres que superaram as barreiras de seu tempo e se destacaram em áreas até então dominadas por homens. Especificamente na ciência, a brilhante Marie Skłodowska Curie, laureada duas vezes com o prêmio Nobel, nas áreas da física e química. A cientista polonesa, entre outros feitos, descobriu dois elementos químicos: o rádio e o polônio.
Enquanto Curie marcou o nosso passado, o tempo atual nos presenteia com as pesquisadoras Jennifer Anne Doudna e Emmanuelle Charpentier que juntas receberam o Prêmio Nobel de Química, no ano de 2020, por haverem desenvolvido o método CRISPR-Cas9 para edição de genoma. Segundo o biógrafo de Doudna, o trabalho da cientista não se limitou em meramente detalhar um fenômeno natural, mas sim na criação de uma verdadeira ferramenta de edição genética, uma genuína invenção “versátil, útil e reprogramável – o que tornava o sistema particularmente importante, tanto do ponto de vista científico, quanto do ponto de vista da propriedade intelectual”. Há um consenso no meio científico e médico que o trabalho desenvolvido por essas notáveis mulheres promove à humanidade novas ferramentas para enfrentar doenças até então sem cura.
No campo das invenções, ainda existe uma persistente lacuna de representatividade feminina no uso do sistema de proteção de propriedade industrial. Segundo dados estatísticos de 2020 divulgados pela Organização Mundial da Propriedade Intelectual – OMPI, nem mesmo 20% dos inventores nomeados em pedidos de patentes internacionais (PCT) eram mulheres. Dessas mulheres, a maioria depositou o pedido de patente por intermédio de organizações públicas de pesquisas e instituições de ensino superior enquanto os demais inventores masculinos são, em maioria, provindos de negócios com fins lucrativos.
Como toda data comemorativa, o dia 8 de março transporta um contexto histórico e 4 ou 5 décadas não seriam suficientes para reparar falhas estruturais perpetuadas por incontáveis gerações. Entretanto, olhemos para o presente como uma oportunidade para corrigirmos o que ainda pode ser reparado. E especialmente no âmbito da inovação, devemos incentivar o engajamento de um número crescente de mulheres para que tenham acesso às ferramentas de gestão e proteção da propriedade intelectual. Assim, a exemplo do legado de Doudna e Charpentier, a sociedade se beneficiará dos inestimáveis avanços que as mulheres podem oferecer para o mundo.