A compatibilização dos efeitos restritivos da Propriedade Industrial com a  liberdade de comércio e de concorrência exigidas pela integração europeia.

Decorre do processo de construção europeia e da consolidação do mercado comunitário uma previsível tensão com a territorialidade dos Direitos de Propriedade Industrial (DPI).
 

A problemática motivadora da análise apresenta-se através do facto da liberdade de comércio e de concorrência, valores adstritos à União Europeia, colidirem com o monopólio a uma escala nacional conferido pelos DPI. O mero exercício dos direitos de exclusivo poderia, potencialmente, impedir a livre circulação de mercadorias dentro da Comunidade.
 

Como método de solucionar a dicotomia exposta surge o conceito de esgotamento dos direitos. Esta regra foi desenvolvida pela jurisprudência do Tribunal de Justiça da União Europeia e, ulteriormente, transposta para as legislações dos Estados Membros. A legislação nacional prevê, de forma expressa, a figura do esgotamento dos direitos através da sua consagração em vários artigos ao longo do Código da Propriedade Industrial português.
 

A doutrina do esgotamento de direitos instaura que o titular de um determinado DPI, ou alguém com o seu consentimento, ao colocar no mercado um produto subordinado ao seu monopólio, esgota o direito de exclusivo, respeitante ao produto em causa no espaço económico europeu. A mercadoria sai, dessa forma, por completo da sua esfera jurídica e pode até ser revendida noutro lugar.
 

Agregado ao esgotamento dos DPI é referido, frequentemente, o conceito de importação paralela. Esta trata-se de uma importação efetuada além do circuito oficial de distribuição de um produto. O sujeito que a realiza é um terceiro independente do fabricante dos produtos e dos seus distribuidores. O importador paralelo compra produtos num mercado onde estes são mais baratos e coloca os mesmos noutro mercado para uma revenda mais cara. Note-se que os produtos alienados através da importação paralela são genuínos. O importador não é um contrafator.
 

As importações paralelas, de acordo com a Comissão Europeia e com o Tribunal de Justiça, são benéficas para o Espaço Económico Europeu, visto que equilibram os preços de mercados dos diferentes Estados Membros.
 

Releva fazer referência ao âmbito territorial do esgotamento. O legislador português optou por consagrar exclusivamente o esgotamento de direitos à escala do Espaço Económico Europeu. Todavia, é de notar que, embora não possa haver esgotamento no plano internacional nas marcas, no que diz respeito às patentes, compete a cada Estado Membro escolher se pretende consagrar ou não o esgotamento dos direitos em relação a países terceiros ao Espaço Económico Europeu.
 

O direito do exclusivo ou do monopólio do produto é completamente derrogado aquando do seu esgotamento?

O esgotamento do direito não é total. O DPI não se extingue per si, sendo que apenas cessa no que diz respeito aos produtos que foram concretamente introduzidos no mercado. A eventual restante mercadoria, ainda não alienada, continua a ser exclusiva do titular do DPI.

Após o posicionamento do produto no mercado, e do consequente esgotamento, outros direitos remanescem com o titular do DPI. O Código de Propriedade Industrial Português exclui o princípio do esgotamento do direito de marca “sempre que existam motivos legítimos, nomeadamente quando o estado desses produtos seja modificado ou alterado após colocação no mercado”.

 

A prevalência do Esgotamento de direito no Espaço Económico Europeu favorece o mercado?

Uma mundividência, unicamente portuguesa, tenderá a levar-nos à réplica de que seria mais profícuo para Portugal o aumento das importações paralelas e, por conseguinte, a introdução do esgotamento internacional.

Se por um lado, e no que respeita às marcas, a harmonização legislativa europeia nos compele a quedarmo-nos pelo esgotamento europeu, quanto à figura das patentes subsiste a eventualidade de incorporar na legislação a figura do esgotamento internacional.

Seremos obrigados a aguardar por evoluções na conjuntura política e económica europeia para indagar se a tendência continuará a ser o protecionismo económico europeu inter pares e a consequente imutabilidade da regra do Esgotamento de direito ou se este adquirirá um caráter universal.