Seria um pouco exagerado falarmos em “rios de tinta”, mas na realidade muito se escreveu e se falou sobre a questão da patenteabilidade de software. Algumas notícias contraditórias sobre a posição do Parlamento Europeu e a atividade do Instituto Europeu de Patentes terão dado origem a uma certa controvérsia -particularmente entre as PMEs- que modestamente tentaremos aqui esclarecer.
Sem tentar complicar, já que o espaço também nos limita, vamos tentar esclarecer um pouco a questão controversa da patenteabilidade de software. A Convenção sobre a Patente Europeia, Art. 52, parágrafo 2, estabelece que não são patenteáveis os programas informáticos. Porém, logo em seguida afirma: “O disposto no parágrafo 2 excluí a patenteabilidade dos elementos enumerados no mesmo apenas na medida em que o pedido de patente europeia ou a patente europeia não se refira a mais do que um desses elementos considerados como tal”. A expressão “como tal” torna-se objeto de polémica ou de interpretação, mas se é verdade que o Parlamento Europeu na sessão de 6 de Junho de 2005 exclui a patenteabilidade dos programas informáticos, não é menos verdade que a Câmara Técnica de Recursos do Instituto Europeu de Patentes tenha interpretado o seguinte: “um programa informático “como tal” não é excluído de patenteabilidade se o programa, ao ser executado ou carregado num computador, produzir, ou for capaz de produzir, um efeito técnico que vá além das interações físicas normais entre o programa e o computador onde o mesmo é executado”. Falamos do efeito técnico que produz um programa, não do programa em si. O efeito técnico que o programa produz ou é suscetível de produzir é patenteável, estando assim excluídos de patenteabilidade os programas que não registam caráter técnico. Estes últimos não seriam patenteáveis, mas sim aqueles que revelam um efeito técnico e que além disso sejam invenções novas, tenham atividade inventiva e aplicabilidade industrial. Vejamos então, pode-se argumentar que qualquer programa gera algum tipo de efeito técnico, pois produz uma interação com a máquina em forma de correntes elétricas, e esse fator elevaria à condição de patenteável todos os programas. Por este motivo foi estabelecido que o efeito técnico deve ir mais além do normal que se produz ao executar qualquer programa. O que é o efeito técnico? Não foi ainda determinada uma definição concreta para o termo, mas há já uma aproximação através da resolução de situações concretas. Se considerarmos os examinadores de patentes, podemos simplificar dizendo que um efeito técnico adicional ao normal aparece quando se modifica uma magnitude física (velocidade, temperatura, tempo, luminosidade, espaço…) e através de exemplos concretos podemos encontrar a solução para cada caso. Não se trata por exemplo de que a invenção poupe tempo ao utilizador, ainda que seja útil (um programa para o cálculo de folhas de vencimento utilizando diferentes incidências), mas sim que o poupe à máquina – e consequentemente ao utilizador (um programa capaz de, em uma décima de segundo, fornecer informação de qualquer titular de um veiculo no mundo através da sua matrícula). Neste caso o patenteável seria o efeito pelo qual se consegue tal instantaneidade. Patenteia-se o efeito do modo como se consegue que a máquina pesquise e proporcione a informação. Não falamos portanto de patentear códigos-fonte, mas sim do efeito técnico executado. Pode dar-se o caso de que o mesmo código seja suscetível de produzir outros efeitos distintos aos que se reivindicam e possa portanto ser utilizado por terceiros para novos fins sem infringir a patente. Outra leitura teria esta afirmação se interpretada pelo ponto de vista dos Direitos de Autor, mas não compliquemos a questão. Se nos cingirmos à prática, vemos que quase todo o software que se cria e utiliza atualmente na indústria tem efeito técnico e como tal é suscetível de patentear. É importante que as PMEs tenham conhecimento disto – tal como as grandes empresas já o têm – para melhorar a sua competitividade através de novas vias de proteção do conhecimento que produzem. Deste modo, à clássica – e com frequência pouco prática – proteção via Código da Propriedade Industrial, se une a proteção derivada do Código de Patentes; sendo a estratégia de cada empresa, assessorada em cada caso por especialistas, a que determina o caminho mais conveniente de proteção para cada caso.